O trabalho em Home Office certamente chamou atenção de muita gente no ano de 2020, quando grande parte das empresas foi obrigada a adotá-lo por conta da pandemia causada pelo novo coronavírus. Esta modalidade é caracterizada pela realização das atividades fora da empresa. A própria tecnologia abriu espaço para o Home Office através de computadores, notebooks, smartphones, plataformas virtuais de reunião e, claro, da popularização da internet.
Este modelo divide opiniões, mas afirma-se como algo a ser avaliado e seguido nos próximos anos.
No início de 2020, bem no começo do isolamento social, trabalhar nas nossas moradas era percebido como a sensação de estar em férias. E mesmo que o trabalho tivesse que ser realizado em casa, não atrapalharia o descanso. Quase um sonho. No entanto, aos poucos, as dificuldades foram surgindo e, aquele ideal antigo de trabalhar em casa, passou a ser visto com outros olhos.
O trabalho à distância ou teletrabalho ou Home Office não é novidade nenhuma. Em Portugal na primeira edição do estudo dos Melhores Lugares para Trabalhar, conduzido pelo Great Place to Work®, já havia aproximadamente 20% das organizações que praticavam o teletrabalho de maneira pontual e restrito a algumas atividades laborais. Esta prática já existe há tempos, em vários países, porém tomou proporções maiores em virtude do avanço da COVID-19. Muitas empresas, resistentes em adotar tal processo, seja por receio ou por traços da sua cultura organizacional, tiveram que rever as suas estratégias para continuarem economicamente ativas no mercado. Esta decisão impactou os dois lados da mesma moeda: o da empresa e o do colaborador.
Vamos entender a preocupação da empresa. Muitos líderes, ao observarem este deslocamento da sua equipa para fora da organização, ficaram a pensar: as pessoas, nas suas casas, irão assistir a programas televisivos, jogar videogames, dormir durante o dia, brincar com as crianças, passear com os seus animais de estimação, enfim, farão tudo, menos trabalhar. Ainda mais, a produtividade irá cair a pique. Estamos arruinados! A produtividade foi e é a grande preocupação de uma grande parte dos gestores em relação ao Home Office.
Já do lado dos colaboradores havia desejos recônditos! Trabalhar em casa sempre foi um sonho. Acordar um pouco mais tarde, tomar um banho demorado, usar roupas confortáveis e, a maior de todas as glórias, não se preocupar com a aparência física. Nada de trânsito ou deslocamentos em transportes públicos, nada de filas para almoçar, tempo livre para tomar um café durante o período de trabalho, ler jornais e, finalmente, ficar longe do chefe!
Os meses foram passando. O nosso trabalho invadiu definitivamente a nossa casa e as nossas horas. Há crianças que querem a atenção e brincadeiras ensurdecedoras e choramingos, pets, televisão ligada, rádio ligado, cozinha com cheiro de comida, barulho das ruas e dos vizinhos. Há necessidade de manter a limpeza e a troca de roupas de cama, de toalhas e roupas, lavar a louça, dar banho às crianças, tomar banho, fazer compras, auxiliar as crianças na lição da escola com aulas à distância, ajudar a nossa esposa ou esposo, ler as mensagens que não param no WhatsApp, no Telegram, no Messenger do Facebook, vídeos no Tinder, e trabalhar! Sim, neste momento, só estamos na nossa casa por causa da COVID-19 e estamos nelas para trabalhar. O sonho tornou-se um pesadelo. Pior pesadelo viveu, ainda, aquela pessoa que vive sozinha!
Bem, a COVID-19 chegou com toda a força. Não havia outra solução para as empresas e tampouco para a grande maioria dos colaboradores. A realidade, desde o final de 2019 até ao dia de hoje, foi e é dura. A pandemia tirou a nossa vida dos trilhos, alterando bruscamente a nossa rotina, desencadeando muita ansiedade, tensão, resistência e o burnout.
Mas que lado está certo? O da empresa que teme a perda da produtividade ou do colaborador que vive um pesadelo constante em relação ao trabalho dentro da sua própria casa?
Pois bem, vamos entender alguns aspetos que trazem luz ao momento caracterizado pela pandemia, pelo Home Office e pela produtividade e que ajudará a entendermos que mesmo a pandemia se apresentando como uma grande ameaça também traz, no seu bojo, uma série de oportunidades.
A produtividade, a grande preocupação das empresas
Não se pode confundir quantidade de horas trabalhadas com produtividade. Precisamos mudar o paradigma de presenteísmo para entrega e qualidade. Quer algumas medidas financeiras e alguns insights?
a) Com uma jornada de 38,6 horas por semana, por exemplo, o empregado americano médio trabalha 4,6 horas a mais que um norueguês. Mas pelo PIB, os trabalhadores noruegueses contribuem o equivalente a 78,70 US$ por hora comparado com 69,60 US$ dos americanos. Ainda mais, e a Itália, o berço de il dolce far niente? Com uma média de 35,5 horas de trabalho por semana, ela produz quase 40% mais por hora do que a Turquia, onde as pessoas trabalham uma média de 47,9 horas por semana. Ela aproxima-se até do Reino Unido, onde as pessoas trabalham 36,5 horas [1].
b) 77% dos Millennials dizem que o horário flexível de trabalho lhes permitiria serem mais produtivos [2];
c) 80% dos profissionais de 96 países afirmam que o trabalho flexível aumentou sua produtividade [3];
d) O Employee Experience (EX) é oferecer ao colaborador uma experiência positiva em relação à sua jornada de trabalho dentro de uma organização e é uma forma de alavancar resultados da produtividade, do engagement e da eficiência das pessoas. Um estudo da Accenture demonstra que investir ativamente na construção da EX garante uma performance 122% maior em relação às empresas do Standard and Poor’s S&P 500 (índice com os 500 maiores ativos do mundo). Este estudo também indica que as empresas com força de trabalho altamente comprometida são 21% mais rentáveis que as empresas com baixos níveis de comprometimento [4].
O Home Office e o colaborador
a) O momento atual pede que ocorra o isolamento social. Os seres humanos, por natureza, são seres sociais. A interação social é um dos pilares da saúde mental. Sentirmo-nos conectados a outros seres humanos é o que nos torna humanos [5]. Estamos acostumados a viver, a resolver as nossas dificuldades e a sobreviver em grupo. Mesmo quando executamos uma atividade de maneira solitária, buscamos o coworking como forma de interagir com outro indivíduo;
b) A necessidade de conexão social permitiu ampliar a utilização de plataformas de reuniões remotas, tais como o Zoom, o Google Meet, o MS-Teams, entre outros. Esta “ponte” tecnológica permitiu retomarmos a contato com o outro. O outro que faz parte de nosso grupo de trabalho, da nossa equipa, faz com que retomemos o sentimento de pertencer, fazer parte de algo maior;
a) Há uma necessidade urgente de adaptação. E porquê? Devemos mudar a forma de ver esta modalidade de trabalho, principalmente para aqueles que sempre atuaram de forma presencial. Porém, se pensarmos bem, tal prática (trabalho presencial) foi adquirida, e repetida, ao longo da vida e, na maioria das vezes, sem questionarmos, o que nos impedia de ver outra maneira de realizarmos as mesmas tarefas;
b) É preciso compreender que mudar hábitos é sempre um desafio para o ser humano, mas, se atribuirmos um novo sentido à realidade, olhando-a por uma nova perspetiva, teremos muitos benefícios. O ambiente de trabalho sempre foi descrito como a nossa segunda casa, por passarmos boa parte do tempo nele e agora, com o trabalho remoto, é a oportunidade de invertermos esta situação. Olhar por este prisma, e tantos outros positivos, tornará o trabalho mais significativo, gerando maior produtividade e, principalmente, maior qualidade de vida.
Então, como conviver com a preocupação, com a produtividade e permitir ao colaborador a interação social a partir do Home Office?
Desde sempre o que permitiu ao ser humano conviver em unidades sociais foi o nível de confiança. Reinvestir tempo e energia, de maneira recíproca entre líder e funcionário, é o caminho para reparar o vínculo de confiança. Quanto mais consistente for este vínculo, melhor o resultado.
O líder deve fazer uma reflexão. Qual é a relação de confiança que tenho com a minha equipa? Acredita que, mesmo que o seu colaborador esteja distante fisicamente, ele desempenhará assuas atividades e dando seu máximo potencial para que os negócios tenham sucesso?
A confiança constrói-se com bom exemplo. Se eu, líder, penso o pior de meu funcionário, o que será que ele pensará a meu respeito? Acredite, o seu colaborador está dando o melhor de si. Todos nós, independentemente de sermos líderes ou liderados, como regra, estamos fazendo o melhor para sairmos ilesos e melhores deste momento.
Confie. A confiança permite ao outro exercitar a autonomia. Autonomia gera inovação, engajamento e produtividade.
Faça reuniões remotas com periodicidade para trocar informações, saber como os seus colaboradores estão, alinhar todos em relação aos principais desafios do negócio e como, todos juntos, superaremos as dificuldades. E teremos sucesso.
Construa um propósito comum. Independente de ser líder ou liderado, tome a iniciativa. Crie um propósito que conduzirá todos a um lugar melhor do que o vivemos atualmente a partir do trabalho executado. “O trabalho deveria ser agradável diariamente. Todos deveríamos trabalhar nas pontas dos pés, subindo as escadas dois degraus de cada vez. Estar cercados de amigos que possam se vestir da maneira que quiserem (até descalços). Deveríamos ter tempo flexível para surfar nas ondas quando estão boas, ou esquiar na neve, ou ficar em casa e cuidar de uma criança doente. Deveríamos acabar com essa distinção entre trabalho, diversão e família” [6].
Pratique a empatia. Coloque-se no lugar das suas pessoas e permita que eles também se coloquem no seu lugar. A empatia é um sentimento que aplaca a desconfiança e os receios.
Não há uma receita de torta para este momento. Há somente confiança que conecta pessoas. Se a conexão não pode ser presencial, que seja virtual.
O que fazer daqui para frente?
Aprender, é só o que nos resta fazer – aprendermos todos juntos. Sabemos que o mundo do trabalho não será como é hoje, mas não saberemos como será de fato. Então, só nos resta entender as tendências e aprender.
Segundo o LinkedIn, numa pesquisa realizada pelo final de 2019, indicou que o benefício mais desejado no trabalho será o tempo. O trabalho flexível será uma exigência da geração dos Millennials e da Z, e estabelecer-se-á uma nova relação com o ambiente físico de trabalho. Menos horas de trabalho talvez não comprometam a produtividade. Menos horas de trabalho podem envolver menos custos de mão de obra. Empregadores e colaboradores beneficiarão com isso, segundo Pencavel, professor de Economia de Stanford que estudou a relação entre a duração da jornada de trabalho e a produtividade [7].
Assim, o caminho será envolver os seus colaboradores na busca de maneiras de trabalhar com mais eficiência em um admirável mundo novo. Nós, equipa do GPTW® Portugal, podemos auxiliar a sua empresa a entender este momento, a partir da compreensão da qualidade do clima organizacional e da Employee Experience (EX), para se posicionar em relação ao futuro.
A propósito
O futuro do mundo do trabalho será o de anywhere – anytime, ou seja, em qualquer lugar e em qualquer lugar.
Great Place to Work®, especialista em confiança!
Na Great Place to Work® temos por hábito dizer que não existe empresa perfeita. Os Best Workplaces™ são organizações que procuram criar um ambiente de trabalho em que haja brilho nos olhos e felicidade em ser parte integrante da organização. A construção de um Best Workplace™ é partilhada entre líderes e liderados para se oferecer a todos a melhor Employee Experience (EX) possível.
Se quiser obter mais informações sobre como as Best Workplaces™ atravasse este momento de pandemia, contacte um de nossos consultores. Se quiser entender como está a qualidade do vínculo de confiança na sua organização, também neste momento, podemos ajudá-los. Estamos à sua disposição.
FONTES
[1] RUGGERI, A. Deveríamos dedicar menos tempo ao trabalho? Conheça os malefícios de exagerar na jornada. Acesso em 01 mar. 2021.
[2] BENTLEY UNIVERSITY. New Survey Reveals What Millennials Really Think About Work. Acesso em 01 mar. 2021.
[3] INTERNATIONAL WORKPLACE GROUP. The workspace Revolution: reaching the tipping point. Acesso em 05 mar. 2021.
[4] ACCENTURE STRATEGY. Repense a experiência do funcionário. Acesso em 25 fev. 2021.
[5] MOSS, J. Dealing with Social Isolation. With millions of workers now telecommuting due to the coronavirus, business leaders must help them foster social connections. Acesso em 26 abr. 2020.
[6] CHOUINARD, Y. Let my people Go Surfing: The Education of a Reluctant Businessman. Penguin Books: New York, 2006.
Especialista em pesquisas quantitativas e qualitativas vinculadas à análise, diagnóstico e gestão da cultura e clima organizacional, em avaliação de práticas de gestão de pessoas, em desenvolvimento de liderança e no alinhamento de recursos humanos à estratégia do negócio. Liderou diversos projetos na América Latina, América do Norte e Europa e ocupou posições executivas no grupo Shell, Riverwood, Great Place to Work® Institute e Aon Hewitt. Professor universitário nas áreas de estratégia, gestão de pessoas, liderança e cultura organizacional e investigador no grupo de pesquisa de Regulação Económica e Estratégias Empresariais.
“Para ter um negócio de sucesso, alguém, algum dia, teve que tomar uma atitude de coragem.”- Peter Drucker